E se a dívida pública portuguesa fosse toda dos portugueses?

Portugal tem hoje uma dívida pública que ronda os 270 mil milhões de euros — valor equivalente a cerca de 87% do PIB. Todos os anos, o Estado paga juros a quem detém essa dívida, sejam bancos, fundos de investimento, seguradoras ou cidadãos através de produtos como Certificados do Tesouro ou de Aforro.

O custo médio da dívida está atualmente em torno dos 3,2% ao ano, o que significa que o Estado gasta cerca de 8,6 mil milhões de euros anuais só em juros.

Mas e se esse dinheiro, em vez de ir para investidores estrangeiros, fosse todo pago aos próprios portugueses? E mais: e se o Estado, em vez de cobrar imposto sobre os rendimentos desses juros, optasse por isentá-los completamente?

1. O custo atual para o Estado

Atualmente, cerca de 50% da dívida portuguesa está nas mãos de investidores estrangeiros. A outra metade é detida por instituições nacionais, incluindo bancos e famílias.

O Estado paga os mesmos juros a todos, mas quando os detentores da dívida são portugueses, parte dos juros pagos volta ao Estado em forma de impostos — através de retenção na fonte sobre juros, IRC de bancos ou IRS dos investidores.

Em média, os juros de obrigações e certificados estão sujeitos a 28% de imposto (taxa liberatória).

Isto significa que, dos 8,6 mil milhões de euros pagos em juros por ano:

  • Aproximadamente 4,3 mil milhões vão para o exterior (sem retorno fiscal);
  • Os outros 4,3 mil milhões ficam no país, mas o Estado recupera cerca de 1,2 mil milhões em impostos sobre esses rendimentos.

2. Cenário hipotético: dívida 100% detida por portugueses

Vamos imaginar que os 270 mil milhões de euros de dívida são integralmente detidos por cidadãos e instituições portuguesas.

Nesse cenário, o Estado continuaria a pagar 8,6 mil milhões de euros em juros por ano, mas todo esse dinheiro ficaria dentro do país — entraria diretamente nas poupanças e contas dos portugueses.

Atualmente, apenas cerca de 100 mil milhões da dívida está em mãos portuguesas. Se subisse para 270 mil milhões, os juros recebidos pelos portugueses triplicariam, passando de cerca de 3,2 mil milhões para 8,6 mil milhões por ano.

Ou seja, os portugueses ganhariam mais 5,4 mil milhões de euros por ano em rendimentos financeiros.

3. O impacto fiscal: sem impostos sobre juros

Hoje, o Estado cobra 28% de imposto sobre os rendimentos de juros de obrigações e certificados. Se decidisse isentar completamente esses rendimentos (como forma de incentivo à poupança nacional), deixaria de arrecadar cerca de 2,4 mil milhões de euros em impostos.

Por outro lado, esse dinheiro ficaria nas mãos dos cidadãos, que poderiam:

  • Reinvesti-lo em novos produtos de poupança;
  • Consumir mais (gerando IVA e crescimento económico);
  • Ou usá-lo para pagar crédito, diminuindo o endividamento das famílias.

Assim, o impacto fiscal líquido seria menor do que parece, pois o Estado perderia receita de IRS, mas ganharia a médio prazo em atividade económica e receitas indiretas (IVA, IRC, emprego, etc.).

4. Custo-benefício para o Estado

Mesmo com a isenção fiscal, o Estado não gastaria mais em juros — pagaria o mesmo. A diferença estaria apenas em quem recebe e para onde o dinheiro flui. Poderia até reduzir a taxa de juro caso não cobrasse impostos.

Hoje, quase metade dos juros pagos sai do país e não gera retorno. Num cenário 100% nacional, o Estado manteria a mesma despesa, mas:

  • sO dinheiro ficaria no circuito interno;
  • As famílias ganhariam mais rendimentos financeiros;
  • O Estado perderia alguma receita fiscal direta, mas pouparia em saída de capital e reforçaria a poupança interna, o que poderia reduzir a dependência de dívida externa futura.

5. Quanto ganhariam os portugueses — e quanto pouparia o Estado

ElementoSituação AtualCenário Hipotético
Dívida detida por portugueses~100 mil milhões €270 mil milhões €
Juros pagos aos portugueses~3,2 mil milhões €/ano8,6 mil milhões €/ano
Impostos sobre juros (IRS/IRC)~900 milhões €/ano2,4 mil milhões €/ano (perdidos se houver isenção)
Ganho líquido dos cidadãos~2,3 mil milhões €/ano8,6 mil milhões €/ano
Saída de juros para o exterior~4,3 mil milhões €/ano0 €
Custo total da dívida para o Estado8,6 mil milhões €/ano8,6 mil milhões €/ano (idêntico)

6. Uma ideia enviada a todos os partidos — e aberta a contributos

Esta análise e proposta conceptual foram enviadas a todos os partidos com assento na Assembleia da República, como reflexão sobre o papel da dívida pública no desenvolvimento económico nacional. O objetivo é incentivar o debate público sobre a possibilidade de uma estratégia de financiamento interno, que permita aos portugueses beneficiar diretamente dos juros da dívida e reforçar a poupança nacional.

Qualquer partido, entidade ou cidadão que deseje contribuir para esta discussão pode responder diretamente através dos endereços públicos de contacto dos grupos parlamentares:

Estes contactos são públicos e constam dos websites oficiais da Assembleia da República e dos respetivos partidos. A partilha desta informação tem caráter puramente cívico e visa promover o diálogo político e económico em torno da dívida pública portuguesa.

7. Conclusão

Este exercício tenta mostrar que, se a dívida pública estivesse nas mãos dos portugueses e os juros fossem isentos de imposto, o país não ficaria mais pobre — apenas redistribuiria o mesmo valor internamente.

O Estado não gastaria mais, mas os cidadãos teriam mais rendimento disponível, e o dinheiro pago em juros permaneceria na economia portuguesa, fortalecendo o investimento e a poupança interna.

Em suma, a dívida pública deixaria de ser uma transferência de riqueza para o exterior e passaria a ser uma forma de os portugueses financiarem o seu próprio Estado — e lucrarem com isso.


Este artigo apresenta uma simulação económica e um exercício teórico baseado em dados públicos. As estimativas de valores e percentagens são aproximadas e destinam-se apenas a ilustrar o impacto potencial de uma política de dívida pública interna. O conteúdo não representa aconselhamento financeiro, nem reflete necessariamente as posições do Governo, de partidos políticos ou de entidades públicas.

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